“Talvez a diferença mais óbvia e atormentadora (para os novos progenitores) entre o sono dos bebés e de crianças pequenas e o dos adultos seja o número de fases do sono. Ao contrário do padrão do sono monofásico e único que observamos nos adultos dos países industrializados, os bebés e crianças exibem padrões polifásicos: muitos períodos de sono curtos ao longo do dia e da noite, intercalados com períodos de vigília, normalmente com vocalizações.
Felizmente para os novos progenitores, quanto mais velha uma criança se torna, mais espaçados, longos e estáveis são os seus episódios de sono. O que explica esta mudança é o ritmo circadiano. Enquanto as áreas que geram o sono são moldadas muito antes do nascimento, o relógio mestre de 24 horas que controla o ritmo circadiano – o núcleo supraquiasmático – leva consideravelmente mais tempo a desenvolver-se. Só depois dos três ou quatro meses de idade, um recém-nascido começa a mostrar sinais discretos em como é governado por um ritmo diário. Lentamente, o núcleo supraquiasmático começa a reconhecer os sinais repetidos, como a luz do dia, as mudanças de temperatura e as refeições (desde que estas sejam fortemente estruturadas), estabelecendo um ritmo de 24 horas mais forte.
Quando chega ao marco de desenvolvimento de um ano, o núcleo supraquiasmático de uma criança já tomou conta das rédeas do rtmo circadiano. Isto significa que a criança agora passa mais tempo do dia acordada, embora faça várias sestas, e, felizmente, mais tempo a dormir de noite. Os espaços de vigília e sono sem ritmo que duravam dia e noite já desapareceram por completo. Aos quatro anos de idade, o ritmo circadiano é a principal força de comando do comportamento do sono da criança, com um período de sono longo durante a noite, normalmente suplementado com uma sesta única durante o dia. Nesta fase, a criança já passou de sono polifásico para um bifásico. Com o fim da infância, o padrão monofásico instala-se finalmente.
No entanto, o que este estabelecimento progressivo dos ritmos estáveis esconde, é uma luta bastante mais tumultuosa entre os sonos NREM e REM. Embora o tempo total do sono diminua gradualmente a partir do nascimento, e se vá tornando mais estável e consolidado, o rácio de tempo passado em sono NREM e sono REM não diminuiu de forma correspondentemente estável.
Durante as 14 horas de sono por dia que um bebé de seis meses dorme, o tempo entre sono NREM e sono REM é repartido numa proporção de 50/50. Porém, uma criança de cinco anos terá uma divisão de 70/30 entre sono NREM e sono REM durante as onze horas de sono diário. Por outras palavras, a proporção do sono REM diminui ao longo da infância, enquanto a proporção do sono NREM aumenta, apesar de o tempo total de sono também diminuir. A descida do sono REM e a subida do domínio do sono NREM continua ao longo de toda a infância. Este equilíbrio estabiliza finalmente nos últimos anos da adolescência com cerca de 80/20 entre o sono NREM e o sono REM respetivamente; a tendência mantém-se durante a idade adulta e até cerca da meia-idade.
A imagem que segue é a de um pequeno livro de canções de embalar que o autor quando o escreveu tinha sido pai há pouco tempo. E à semelhança de muitos progenitores, estava a sofrer bastante com o acordar constante do bebé. “Leio-te uma última história/se me prometeres que dormes, porra!”
Fonte: Walker, Matthew; Porque dormimos?; Men’s Journal, fevereiro 2019, 978-989-8892-25-6 Pág 100 a 102